8 de maio de 2011

Infância 2

Eu não nasci grande, eu não nasci sabendo, eu não nasci professora. Estudei a vida toda em escola pública, não havia livros didáticos e nem cadernos espirais. Tínhamos um brochurão pequeno para todas as matérias. O uniforme tinha que ser igual, não podia usar chinelo, sandalinha, bota, rasteirinha. Short nem pensar, calça jeans era coisa de rico. Calçava uma conga azul com o bico branco que sujava horrores, todo dia era preciso limpá-lo com paninho. Meias eram dois pares, um lavando e outro no pé. Merenda? Só a da cantina. Ninguém tinha diabetes e nem obesidade precoce. Responder professora? Expulsão na certa. Ir para a coordenação? Só se fosse chorando com medo do coro que ia levar em casa. Não tinha conselho tutelar, não tinha estatuto da criança e do adolescente, havia 180 dias letivos, entrávamos de férias em 30 de novembro, todos sabiam ler e fazer contas. Não havia bolsa escola, bolsa família, livros caríssimos emprestados, livrinhos de literatura, mochilas da moda, nada disso. E éramos felizes, muito felizes. Minha família era muito pobre e desde cedo eu sabia que a única forma de vencer na vida era estudando. Sempre fui uma aluna exemplar, nunca perdi média, nem tirei nota vermelha no boletim. Sabia a tabuada de cor na segunda série, fazia redações que eram premiadas pela diretora da escola. Na época não tinha computador, videogame, balas, refrigerantes e chips eram lanches de fim de semana quando tinha festinha na casa de algum coleguinha. A minha mãe ia em todas as reuniões e apresentações na escola, mesmo trabalhando o dia todo como empregada doméstica. Ela me acompnhava em tudo, me levava ao cinema e ao teatrinho. Isso quando o dinheiro sobrava. Andar de carro era luxo. Naquela época não havia ônibus escolar e a gente tinha que ir andando pra escola, mas todos estudavam perto de casa.

Fui crescendo, a vida foi melhorando, estudei, fiz faculdade na UFMG, tive meus filhos ainda jovem, passei no concurso da prefeitura entre os 130 primeiros colocados disputando com 20 mil candidatos. Hoje minha mãe não trabalha mais em casa de família, é aposentada e continua linda. Se vocês soubessem como era difícil estudar naquela época, dariam mais valor ao que têm hoje. Mas os tempos mudaram e a sociedade mudou junto. Espero um dia poder ver alguns dos meus alunos trilhando o caminho da verdade e da justiça, conseguindo um trabalho digno através de estudos. Daqui a nove anos eu me aposento e sentirei saudade de todos vocês. Quando um dia, se por acaso encontrá-los no futuro, lembrem-se de mim e saibam que eu tenho por vocês um enorme carinnho e dedicação. Abraço a todos.

Professora Chris


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3 comentários:

nathália disse...

Sua história é um exemplo de vida para todos!!!
Agradeço a Deus pos você entra na minha vida! Tudo que conquistei na escola foi por ajuda sua e da Áurea!!
beija!!!!!

Ana disse...

Chris sua historia de vida é simplismente um lindo exemplo de superaçao.Você é um exemplo de vida.Eu sinto saudades de quando ainda nao era tao facil ter net,ai ainda brincávamos de pique esconde,pega pega...agora? computador,televisao,videogame...e as pessoas se acham as mais felizes do mundo.Nao.Feliz eu era antes de vim pra bh,brincava na rua,sem ter carro toda hora passando,brincava ate tarde sem deixar minha vo preocupada,ai sim eu me divertia mais agora?NAO que eu nao goste do pc mais eu era amis feliz brincando na rua,pc agora é so um dos modos q eu enontro para passar o dia

bjs

Marcela disse...

Chris,parabéns pela sua história, parabéns por tudo que você passou , e ainda conseguir sorrir de uma maneira tão humilde e verdadeira. Uma inspiração de vida para qualquer um , obrigada por tudo . E continue assim pois é isso que te torna especial para tantas pessoas , inclusive eu ! HAHA Beijiinhoos !